sexta-feira, 19 de agosto de 2022

A Órfã: A Origem (2022)

É difícil para mim assimilar como já se passou tanto tempo desde que o espanhol Jaume Collet-Serra nos entregou A Órfã (Orphan, 2009), o suspense que me gelou a espinha quando exibido dois anos mais tarde na programação do SBT. Baseado numa macabra história real, que deu o status instantâneo de novo ícone do terror para Esther (Isabelle Fuhrman), a garotinha de aparência inocente que revelava não ser uma simples garotinha, para o desespero da família da Vera Farmiga. A cogitação de uma sequência sempre esteve no boca a boca do público, ansioso por ver mais da personagem, mesmo que o criador de argumento da personagem, Alex Mace houvesse dado um ponto final para ela no grande clímax. Mas a história da mulher adulta presa no corpo de criança era certamente difícil de ser esquecida, e continuou a ressoar como uma lenda urbana no imaginário popular, até que enfim a Dark Castle junto a eOn dois anos atrás tiveram uma ideia nova, após serem contatados por Isabelle Fuhrman e anunciaram a sequência, que não seria bem uma sequência... Mas sim um prequel que acompanha a residência anterior da assassina, antes dos eventos em 2009, com Fuhrman retornando como protagonista. Onze anos atrasados, e com a distribuição da Paramount, Esther está entre nós novamente.

Situado no ano de 2007, a ação tem início no The Saarne Institute localizado em algum lugar da Estônia, a partir da chegada de Anna (Gwendolyn Collins), uma funcionária da Assistência Social com um propósito não muito claro na instituição, o Asilo de internamento para pacientes com problemas mentais, aonde encontra Leena, a verdadeira (?) identidade da mulher-criança. Não demora muito para ela arquitetar a fuga, como Michael Myers fugindo da ala psiquiatra, e de forma violenta manipulando um guarda pedófilo deixa o Instituto e escapa para longe graças a oportunidade que enxergou com a chegada da mulher. Mais tarde ela é encontrada por um agente de Polícia e assume a identidade de Esther Albright, uma garotinha desaparecida que descobriu no sistema de crianças desaparecidas, que compartilha similaridade com ela. E é assim que parte para a região de Connecticut nos Estados Unidos, para se encontrar com a influente família Albright, formada por Tricia (Julia Stiles), o marido Allen (Rossif Sutherland) e o filho mais velho, Gunnar (Matthew Finlan).


O roteiro de David Coggeshall (de Evocando Espíritos 2, curiosamente também ambientado em Connecticut), reutiliza a estrutura vista no primeiro longa, com o telespectador testemunhando passo a passo as mesmas ações da vilã com a nova família, com a iminente tragédia à espreita. O grande dilema ao se realizar um prequel é: como estabelecer a ameaça quando já a conhecemos? Pois há surpresas à frente. O diretor William Brent Bell (colecionador de péssimos filmes como Boneco do Mal 2), primeiramente utiliza a personagem como uma carniceira extremamente manipulativa, talvez para tentar fazer jus à fama conquistada, a colocando para agir e matar inescrupulosamente, para então com a família, mudar a dinâmica revelando que ela não é mais a maior ameaça presente nesta sequência. Depois de tantas facilitações narrativas, chegando ao exagero nas ações da personagem (e voltando a citar o mascarado de Halloween, há até mesmo um momento absurdo que a coloca sob o volante de um carro), essa mudança brusca consegue trazer um ar divertido, e é o que o diferencia do filme anterior. Sem entrar em maiores detalhes, a perspectiva muda e a nossa aflição está em ver como a assassina se livrará de sua nova vida.

Para um filme intitulado como A Origem, ou First Kill (a primeira matança), na realidade não há uma verdadeira expansão na mitologia por trás de Esther, continuaremos a não saber sobre o seu nascimento e infância, e sequer retratam o seu primeiro homicídio. Os eventos mostrados aqui, principalmente com a interação familiar existem para explicar as habilidades demonstradas pela personagem nos futuros acontecimentos com os Coleman. Gunnar é praticante de esgrima e Allen, o homem que rapidamente conquista a afeição da falsa filha é um pintor, que a ensina sobre a técnica da reflectografia de infravermelho. Tricia é uma figura materna de mente calculista e imponente, com uma boa composição de Stiles, quase chegando a altura da força que representa Esther. Há um contratempo com a intromissão do detetive Donnan (Hiro Kanagawa), que até cumpre alguma função. Isabelle Fuhrman volta a preencher o icônico papel com vividez, ainda que tirem parte de sua força assustadora. A violência vem em boas doses, ainda que poucos confrontos físicos ganhem melhor aproveitamento cênico. O responsável pela cinematografia é ninguém menos que Karim Hussain, o diretor de Subsconscious Cruelty (2000), e que recentemente fez um belo trabalho na fotografia de Possessor (2020). E falando sobre a grande questão, sobre como conseguiram voltar com a atriz adulta no papel de criança, driblando o grande uso de CGI com técnicas de maquiagem e ângulos de câmera, seu rosto causa muita estranheza inicialmente. Quem estiver afim de criticar a produção, fará a festa. É preciso também mencionar a importância da participação da dublê, Kennedy Irwin, de 11 anos.

A Órfã: A Origem termina por não acrescentar muito ao que já se sabia anteriormente, e pouco se equipará ao impacto do primeiro exemplar, apesar das voltas criativas. E preciso afirmar como é até um pouco surpreendente como William Brent Bell não fez disso um desastre total, ainda que o argumento sofra de diversos equívocos e problemas. Para quem gosta de falar sobre tais "furos de roteiro", terá assunto de sobra, ao contrário daqueles que forem mais descompromissadamente conferi-lo para prestigiar a graciosidade perigosa de Fuhrman. Pode ser resumido essencialmente como uma tragédia romântica, uma jornada sobre a desilusão da personagem, que a tornou cruel e implacável até encontrar os Coleman. O caminhar por entre as chamas em sua parte derradeira, é o ápice desse apelo plástico, que clama por a imortalizar na cultura pop, e que por esse breve momento cumpre perfeitamente sua função.


O filme deve chegar em Setembro nos cinemas nacionais, mas se pode conferir A Órfã: A Origem com legenda provisória aqui. Ou aqui.

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