sexta-feira, 6 de maio de 2022

Stanleyville (2021)


Com direção do ator Maxwell McCabe-Lokos, Stanleyville é uma produção canadense independente que esteve no circuito de festivais do gênero fantástico durante o ano passado, tendo uma recepção mista por público e crítica, e que agora disponível na web me foi uma grande surpresa no sentido de encontrar uma obra com uma identidade diferente e um pouco de ousadia ao brincar com a lógica e percepção do público. Inclusive muito dele me fez lembrar da série sensação da Apple sobre o estranho mundo corporativo, Severance/Ruptura (2022) pela forma como instiga o mistério e explora a dinâmica entre o time de personagens.


Nele acompanhamos Maria Barbinza (a austríaca Susanne Wuest, que o mundo já deve conhecer como a mãe de rosto enfaixado em Boa Noite, Mamãe), uma mulher insatisfeita e frustrada com sua vida e a própria existência que acredita ter finalmente recebido o sinal de uma "força maior" do universo, depois de observar um pássaro sobrevoar o prédio do escritório em que trabalha, e se chocar contra o vidro da janela. Cansada da vida em casa com a família, ela sai e se desfaz de sua bolsa junto a todo seu dinheiro e pertences e caminho do shopping, onde é repentinamente interceptada por um estranho que se autoproclama Homunculus (Julian Richings), que a avisa que ela foi selecionada entre milhões de candidatos para participar de um experimento competitivo.


O que ele a promete é a chance de alcançar a "transcendência", através de conflitos primitivos que testarão a articulação entre mente e corpo ao lado de outros quatro competidores por oito rounds. O prêmio? Possuir uma chave. Barbinza claramente aceita, e vai até o prédio de encontro onde conhece seus colegas oponentes: Andrew Frisbee (Christian Serritielo), Felicie Arkady (Cara Ricketts), Bofill Pancreas (George Tchortov) e Manny Jumpcannon (Adam Brown).

 
Os jogos começam, e a primeira prova é encher balões, o que parece bobagem de início mas conforme avançam os desafios as incertezas e a inversão de lógica aumentam entre os cinco personagens. Nesse cenário um quadro de uma figura masculina de um soldado, uma língua desconhecida e um órgão de comunicação luminoso à lá Naked Lunch by Cronenberg fazem ilustrações do inconsciente e irracional de uma disputa que sequer tem um objetivo claro.

Os instintos primários por vitória, auto-satisfação e o materialismo é que os guiam. Suas necessidades marcadas em suas personalidades se intensificam e o jogo parece existir para levá-los ao limite sobre quem realmente são comportamentalmente. Maria é quem está alheia para decidir um rumo no topo da disputa, estando mais consciente e atenta, mas nem por isso corre menos riscos.


McCabe-Lokos parece ter tido toda a liberdade necessária para concretizar suas melhores ideias em torno de sua obra, fazendo dela um produto estranho e novo que parte do mistério até a comédia para provocar e surpreender o público, como um filme digno de alguma vanguarda moderna, e há até mesmo um background surrealista e que a direção de arte muito utiliza em meio a essa dinâmica de grupo onde explora as tensões existentes que ecoam de cada um ali presente. Richings e Wuest dispensam comentários com sua performances, e é preciso comentar as farpas divertidas que Ricketts e Serritielo protagonizam tão bem, enquanto Tchortov com seu Xircolite e Brown tem ótimos momentos de formas singulares de acordo com seus personagens. A trilha composta por Joseph Shabason é outro grande destaque pelo uso de diversos instrumentos, criada para ocupar cada momento particular do filme.


Stanleyville se conclui com morte e desorientação, mas em meio ao caos retoma o simbolismo de início, e de alguma forma respiramos pela última vez para contemplar a liberdade alcançada junto a Maria. As peças podem não se encaixar por completo, mas a coerência e o domínio exercidas pelo diretor são sentidas de forma completa, deixando uma forte impressão de sua capacidade de realização.

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