O filme inicia com a mudança de residência e país de Julia (Maika Monroe), uma ex-atriz, segundo ela mesma, com o marido Francis (Karl Glusman) para Bucareste, Romênia onde estão as raízes familiares, e um promissor novo cargo no emprego para ele. Tentando se habituar a rotina em longos dias enquanto ele está fora, Julia começa a perceber que é observada no prédio a frente por um desconhecido. O isolamento e a frustração com a barreira de estar em outro país, interagindo com os vizinhos e amigos do marido que falam uma língua que não compreende gradativamente contribuem para se começar a se sentir desgastada, ao ficar atenta em notícias sobre um assassino de mulheres pela região, que ganha a alcunha de "the Spider" pelos jornalistas, devida ao bárbaro modus operandis como as mata, o vizinho stalker então vira um grande incômodo em sua mente, sentindo o lar ameaçado, invadido e vigiado, mesmo que o estranho não tenha cruzado uma barreira de civilidade.
É quando descobrir a identidade da figura masculina na janela se torna uma obsessão para a mulher, para poder voltar a estar em um estado de paz. É preciso dizer que é uma coisa um tanto previsível, essa premissa é conhecida por todos, mas Okuno sabe trabalhar a espiral de desconfiança, nos fazendo questionar se afinal, haveria porque uma sombra distante causar tanto dano? Ainda que nunca se coloque numa posição contrária à personagem, se trata mais de uma decisão que atenta para a presença da hostilidade da sociedade contra as mulheres e a dúvida sobre suas inseguranças. Francis tenta colaborar como um bom marido mas não é um aliado para ela nesse mistério. É sim, a vizinha de porta, Irina (Madalina Anea) que se revela uma agradável companhia, e que por falar inglês reduz sua solidão. Mas ao identificar o suspeito, suas vidas se entrelaçam de tal forma que a persistência em penalizar o desconhecido afetará todos ao redor.
O que impede Watcher de ser classificado como um suspense genérico sobre paranoia, é o tom soturno bem cuidado, e por Okuno saber filmar e criar planos belíssimos que ilustram perfeitamente bem a posição solitária em que está Julia, em constante tensão na residência e pelos espaços urbanos de Bucareste. O momento que a personagem adentra o cinema para uma sessão do clássico de Stanley Donley, Charada (1963) com Audrey Hepburn e Carey Grant é breve mas uma bela prova de execução para provocar um leve arrepio na poltrona. É fácil concluir que cineastas como Alfred Hitchcock e Louis Malle seriam inspirações da diretora, que afirma um interesse em trazer frescor pela perspectiva feminina nesse estilo de thriller de stalker, movendo o foco para a inquietação de sua protagonista e não nas atividades do invasor de sua privacidade. Não haveria melhor atriz aqui se não Maika, aliás, ela tem uma presença notável em cada enquadramento, se trata de um papel contido, é sobre uma mulher que luta silenciosamente contra a repressão afinal, as turbulências transbordam expressivamente em sua feição.
Se a pauta de gênero é uma segunda camada que pode ter uma leitura de forma consistente pelo público, Chloe falha em resolução de conflitos, e mesmo que o suspense seja um guia de interesse, nem tudo gera um grande engajamento, até mesmo há um descarte ou outro de elementos mencionados que poderiam aumentar a composição do filme, como um antigo vício em nicotina da ex-atriz, ou mesmo a afeição com Irina. O desfecho não chega a uma conclusão tão surpreendente, mas as proporções em que o roteiro avança faz com que seja memorável após a cena final, e também é preciso mencionar o desempenho de Burn Gorman. Chloe é sim uma diretora que começou a desenvolver uma identidade como cineasta, mas deixa a impressão de que poderia se comprometer e mergulhar um pouquinho mais para um resultado ainda melhor. Watcher ficará na memória por enquanto nesse segundo semestre de 2022, até pelo destaque de Maika Monroe no hall de performances, mas pode vir a ser ofuscado por outros títulos até o fim do ano.
Assista Watcher aqui.