quarta-feira, 6 de julho de 2022

Nobody's Hero (2022)

Alain Guiraudie é o cineasta francês que no mesmo ano de Azul é a Cor Mais Quente (2013), lançou o ainda mais polêmico e explícito, Um Estranho no Lago, que permanece como o seu filme mais conhecido pelo público. Aquele thriller homoérotico ambientado numa praia nudista servia bem de introdução ao cinema provocativo de Guiraudie, que muito provavelmente é o grande autor ainda em atividade a representar a complexidade em torno da sexualidade no cinema, que nunca se resume a isso mas é o grande motor em Os Fortes Não Descansam (2003) e O Rei da Fuga (2009). É necessário começar o texto de forma didática e revente assim porque não é simples a tarefa de descrever o que ele filma, e não dá simplesmente afirmar como é mais um diretor do "nonsense", especialmente em seu mais novo lançamento, Nobody's Hero/Viens je t'emméne que abriu a Mostra Panorama no Festival de Berlim este ano, que tem muito a dizer quanto mais se empurra para a beira do absurdo. 


Nele tudo se tem início a partir do encontro repentino entre Médéric (Jean-Charles Clichet) e Isadora (Noémie Lvovsky) pelas ruas de Clermont-Ferrand durante a época de Natal, a mulher é comprometida e não enxerga o matrimônio como um impedimento para sua vida sexual compulsiva, que a leva a se prostituir mesmo com o desaprovamento do marido, Gérard (Renaud Rutten) em um hotel discreto, para aonde ela segue com Médéric depois. O encontro sexual, no entanto, é frustrado pela notícia de um ataque terrorista na cidade, mas instigado a saber mais sobre a misteriosa mulher, o homem começa a se meter em problemas por ela e o jovem marroquino, Selim (Iliès Kadri) que vive desabrigado nos arredores do condomínio e que passa a abrigar em seu apartamento, e é quem Médéric suspeita estar envolvido no recente ataque. 


O rapaz também é motivo de intriga com os vizinhos, Mr. Coq (Michel Masiero) e Mr. Alaoui (Philippe Fretun) atentos aos movimentos dos imigrantes que consideram marginais em suas ruas. Também é motivo de interesse a garota auxiliar do hotel, Charléne (Miveck Packa). Todas esses encontros e circunstâncias vão formando uma leve bola de caos, quanto mais ele se intromete e faz com que esses estranhos participem da sua vida. Que ainda tem mais na cola, Florence (Doria Tillier).


É assim que Guiraudie vai deturpando os códigos morais e civis para debater sobre a civilidade nessas pessoas, com um problema de condomínio ilustra o problema de toda a nação francesa, atualmente em um termo indefinido com a xenofobia e os crescentes casos de terrorismo. O sexo explícito aparece em menores doses mas não deixa de ser encenado de uma forma próxima e desajustada, tendo uma leitura sobre sexualidade em segundo plano, como consequência narrativa que não deixa de ser complexa, quanto mais vemos das complicações românticas do protagonista. Para um diretor conhecido em concentrar seus personagens em regiões isoladas no campo, pode vir a parecer tarde demais para se mover até centros populares, quanto mais se inserir em discussões tão problemáticas, que pode serem vistas com um fácil tom errôneo. Mas quando não foi assim também? Tudo é uma grande provocação a caretice do público atual, não querendo se validar meramente como cinema político, mas sim aproveitando o atual cenário própicio para aplicar sua acidez e nos deconcertar de formas novas ironizando a sociedade. 

Assista Nobody's Hero (com legenda provisória) aqui.

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